Como é feito o Grana Padano: o queijo DOP mais consumido no mundo

Visitamos a Cooperativa SoLat e vimos de perto a produção do queijo que amamos

Continuávamos na companhia de Valério, na região da Baixa Brescia. Hoje aposentado, Valério trabalhou anos no mundo dos queijos, assunto que domina muito. Podíamos ficar horas e horas escutando ele falar sobre as características e a produção dos queijos. Era sempre uma aula!

Mas a prática veio quando fomos ver de perto a produção de um dos nossos queijos preferidos: o Grana Padano.

queijo Grana Padano
Por dentro da produção do Grana Padano

Se você gosta de queijos tanto quanto a gente com certeza já ouviu falar dele ou do seu primo mais velho, o Parmigiano Reggiano, que possuem a mesma linhagem genética, mas o tipo de sangue é completamente diferente, fazendo uma analogia um pouco estranha.

Pra gente aí no Brasil, para facilitar o entendimento, é tudo “parmesão”, mas na verdade é quase um crime comparar o queijo que chega aos mercados brasileiros com o nome de parmesão com um queijo DOP italiano.  

O Brasil vem se aperfeiçoando na arte de fazer queijos e Minas Gerais é um dos polos percussores desse movimento. Na pequena cidade do Serro é possível encontrar queijos maturados de qualidade espetacular. Se quiser provar um ótimo queijo brasileiro maturado, procure pelos pequenos produtores do Serro!

Conhece um bom produtor de queijos maturados no Brasil? Conta pra gente nos comentários!

queijo Grana Padano
A sigla DOP vem marcada em todas as peças de queijo que foram aprovadas
pelo controle de qualidade

O que é um queijo DOP?

Aqui na Europa certos produtos são protegidos por legislação específica que regulamentam todo o seu processo de produção. O objetivo é proteger a sua qualidade, promover a sua venda e garantir que o consumidor saiba exatamente que tipo de produto está ingerindo.

Os produtos com Denominação de Origem Controlada são considerados especiais porque unem uma série de fatores humanos e ambientais que os distinguem dos demais. Como fator humano queremos dizer, por exemplo, uma tradição, um modo de fazer, passado de geração em geração. O fator ambiental está ligado ao ambiente geográfico, como o clima, o solo, a altitude, etc. que influenciam diretamente nas características do produto.

Assim, essencialmente, os produtos DOP são conhecidos pela alta qualidade e são bem característicos de um determinado território. 

Ou seja: não é qualquer pessoa ou empresa que tem a permissão de fabricar um produto com selo DOP, nem em qualquer lugar, muito menos de qualquer forma.

queijo Grana Padano
Cada face de cada fileira contém 1496 peças de queijo Grana Padano!

A Cooperativa: SoLat

A Cooperativa SoLat é umas das 128 empresas autorizadas pelo Consórcio a produzir  o queijo Grana Padano DOP. Desde 1960, a Cooperativa se encarrega de transformar 100 mil litros de leite em queijo, todos os dias! Ao final do ano, cerca de 65 mil formas de Grana Padano são produzidas. A sala de maturação que tivemos o privilégio de visitar possui, hoje, cerca de 110 mil formas de queijos que serão maturados entre 10 e 20 meses.

Segundo os dados do Consórcio, os 128 laticínios autorizados produziram, no ano de 2018, 4.932.996 formas de Grana Padano! Dá pra imaginar?

Foi na SoLat que vimos de perto como é produzido um dos nossos queijos preferidos!!

Como é feito o queijo Grana Padano DOP?

Para início de conversa é bom saber que o Grana Padano é definido como queijo feito com leite de vaca cru, parcialmente desnatado por processos naturais, com massa cozida, dura e de envelhecimento lento.

queijo Grana Padano
Força: cada forma pesa aproximadamente 40kg

Em relação à produção, o regulamento diz que:

* O queijo Grana Padano é produzido a partir de leite cru de vaca ordenhada duas vezes ao dia, que deve ser recolhido no máximo 24 horas a partir da primeira ordenha. O leite não pode sofrer nenhum tratamento físico, mecânico ou térmico que modifique a sua característica natural antes de começar a ser trabalhado.

* O leite deve ser parcialmente desnatado por método natural, deixando-o repousar em uma temperatura entre 8 e 20°C.

* O leite da ordenha da noite anterior é deixado em grandes recipientes por até 15 horas, durante as quais uma parte da gordura do leite emerge a superfície. Essa nata é retirada pela manhã. O leite que sobra é misturado com o leite integral da ordenha da manhã, resultando num leite semi-desnatado, com cerca de 2,4-2,7% de gordura.

* O leite é então despejado em caldeiras de cobre. Ali ele recebe o “pingo” (o soro do leite do dia anterior, chamado pelos italianos de siero innesto) e o coalho que deve ser de origem animal (retirado do estômago de vitelo).

* A coalhada deve ser cortada em grãos bem finos e cozida em uma temperatura máxima de 56ºC, até que o grão fique elástico.

“O ponto perfeito da massa nenhuma máquina consegue precisar. É o toque do mestre queijeiro experiente que irá dizer se a massa está boa ou não”, nos contou Luciano Storti, responsável pela produção do queijo na SoLat.

Segundo o regulamento, a massa fica repousando por no máximo 70 minutos quando é finalmente enformada. Depois deve ficar descansando por no mínimo 48 horas antes de ser colocada em salmoura.

Nessa etapa, na Cooperativa SoLat, as formas vem giradas manualmente 3 vezes ao dias, para garantir que a gravidade não deforme a peça.

Já na salmoura, as peças devem ser mergulhadas por completo no líquido formado apenas de água e sal por um período que pode variar entre 14 e 30 dias.

Depois o produto vai parar nas enormes prateleiras, onde envelhece em temperatura entre 15ºC e 22ºC por um período mínimo de 9 meses. A cada dois meses a casca vem lavada por processo automatizado.

No oitavo mês os queijos já estão prontos para passar pela inspeção do Consórcio.

Os queijos que estiverem dentro dos padrões exigidos, ganham uma marcação a fogo com a sigla DOP. Se o queijo tiver algum tipo de problema, é cancelada a marcação com um X sobre o nome grana padano.

Importante é que antes dos nove meses de maturação, o queijo não pode ser comercializado, nem mesmo pode sair da zona de produção. Já se alcançar 20 meses de envelhecimento, o queijo pode ser individualizado como RESERVA e ganha uma segunda marcação a fogo.

Ao final, a forma cilíndrica, com as paredes ligeiramente convexas e faces planas, pode pesar entre 24 e 40 kg. Como medida, deve ficar entre 35 a 45 cm de diâmetro e de altura de 18 a 25 cm.


Descubra mais sobre a produção do Grana Padano!
Nossa sugestão de livros sobre Gastronomia e Culinária

Onde pode ser fabricado o Grana Padano?

Trinta e duas províncias de cinco regiões da Itália podem produzir o Grana Pandano, O queijo com denominação de origem só pode ser produzido por empresas autorizadas localizadas nos seguintes territórios: Alessandria, Asti, Biella, Cuneo, Novara, Torino, Verbania, Vercelli, Bergamo, Brescia, Como, Cremona, Lecco, Lodi, Mantova à esquerda do Rio Po, Milano, Monza, Pavia, Sondrio, Varese, Trento, Padova, Rovigo, Treviso, Venezia, Verona, Vicenza, Bologna à direita do Rio Reno, Ferrara, Forlì Cesena, Piacenza, Ravenna e Rimini, e ainda nos seguintes municípios da Província de Bolzano: Anterivo, Lauregno, Proves, Senale-S. Felice e Trodena.

queijo Grana Padano
Queijo fresco indo para a sala onde ficará descansando em salmoura

Por que o Grana Padano é tão bom?

Primeiro temos que dizer que “bom” e “ruim” são conceitos completamente subjetivos e por isso podemos ficar completamente à vontade para dizer ao mundo que não gostamos de picanha, nem de chocolate ou que adoramos quiabo e chá de boldo.

Entretanto, em se tratando do queijo DOP mais consumido no mundo, temos que concordar que alguma coisa de especial ele tem, a começar pela consistência.

O Grana Padano tem a textura áspera e um aspecto cristalizado, motivo pelo qual não deve ser cortado, apenas lascado. A consistência não chega a ser dura, já que no mínimo deve conter 32% de gordura, mas é bem rígida e quebradiça. Nos dentes, em algumas mordidas, o queijo parece arranhar o esmalte, liberando um sabor único. É a tirosina, o tesouro que cresce dentro do Grana Padano. 

A tirosina é um aminoácido que deriva da degradação das proteínas do leite. O processo é feito naturalmente por bactérias durante a maturação do queijo.

O sabor puxa para o salgado ou, como diriam alguns, de umami, o quinto sabor que é difícil descrever em palavras, mas fácil de entender com um pedaço de Grana Padano na boca.

Ao final é quase impossível comer apenas um pedaço, já que à primeira mordida a boca se enche de água e pede, ansiosa, pelo próximo pedaço.

queijo Grana Padano
Fãs!

Qual a diferença entre o Grana Padano e o Parmigiano Reggiano?

Segundo os nossos professores na arte de fabricação de queijo italiano, o processo é semelhante, mas dois detalhes fazem a diferença: a maturação e a alimentação que é dada ao gado leiteiro.

O regulamento do Parmigiano Reggiano é mais exigente nesse último aspecto, só permitindo o uso de pasto fresco ou feno. O Grana Padano, ao invés, permite também o uso de silagem, o que resulta, em teoria, num leite de menor qualidade.

Quanto à maturação, no Grana é de no mínimo 9 meses (chegando ao seu máximo potencial em torno de 20 meses), enquanto que o Parmigiano deve maturar por no mínimo 12 meses, com um consumo ideal aos 24 meses.

Além disso, a abrangência territorial do Parmiggiano Regiano é muito menor que a do Grana Padano, além do primeiro só poder ser elaborado com leite de apenas uma ordenha.

Depois da visita à Cooperativa SoLat, voltamos para casa com um Grana Padano em mãos e tivemos a (feliz e deliciosa) oportunidade de colocar os dois queijos lado-a-lado.

Valério nos guiou pela degustação dos queijos e foi possível ver a diferença entre o aroma, a consistência e o sabor. Enquanto o Grana Panado era mais aromático, macio e de sabor mais suave, o Parmigiano era mais duro, com sabor menos complexo, mais maduro. Enquanto um Grana Padano tem a explosão de um jovem, o Parmigiano tem a tranquilidade de um senhor de meia idade.

Entre um e outro, não nos restaram dúvidas: sorte mesmo tem os italianos de poderem apreciar essas duas iguarias!

[su_box title=”Società Agricola Cooperativa SOLAT” box_color=”#e5e6e4″ title_color=”#090a09″ class=”Pasticceria Cagna”] Caseificio: Castelletto di Leno (BS)
Località Salvasecca
www.cooperativasolat.it
[/su_box]

7 Comentários

  1. Muito boa a matéria! Obrigado por compartilhar os detalhes do processo.
    Só uma dúvida, não seriam 100 mil litros de leite ao dia ao invés de 10 mil, para chegar ao volume total de queijo produzido anualmente?

    1. Author

      Você tem toda razão, Neocir! Faltou um zero ali. Já corrigimos. Muito obrigado! Abraços.

  2. Muito boa a explicação. Os italianos protegeram bem as marcas que são um referência de qualidade e sabor únicos. O processo de desnate natural, por hora e o uso do pingo (soro-fermento) é único, tradicional e fundamental para os dois tipos de queijos. Vou agora comprar. Parabéns.

    1. Author

      Olá José! Os italianos são mestres mesmo nessa arte. Aprendemos muito com eles! Obrigado pela visita aqui no blog. Abraços e boa degustação! Dani e Vini

  3. Preparando uma viagem pela Itália, achei alguns vídeos de vocês, maravilhoso e perverso, kkkkk…
    Estou amando tudo o que vi, peguei algumas dicas, mas infelizmente não consegui agendar para visitar a produção do GranaPadano (meu preferido), só do Parmeggiano.
    Quero ir naquele restaurante que foram perto de Modena…. hummmm,

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *