Provando a delícia amazônica direto da fonte.
Ela é cheia de nutrientes, faz sucesso entre os gringos e já ganhou muitos nomes. A Castanha da Amazônia como vamos tratá-la aqui, já foi chamada de Castanha-do-Pará e Castanha-do-Brasil (Brazil nuts). O nome foi ficando mais abrangente, já que é encontrada não só no Brasil, muito menos só no Pará, mas em quase todo território sul americano que abriga a Floresta Amazônica.
Seja qual for o nome comercial dado à “castanha”, fato é que somos verdadeiramente privilegiados por ter essa riqueza de forma nativa em nosso território. Uma pena que o preço dela não seja acessível a todos os brasileiros.
Sem falar nos impostos, na longa lista de intermediários até a chegar no final da cadeia consumidora, o fato é que o processo de colheita e beneficiamento da castanha-da-Amazônia não é simples e foi isso que pudemos ver de perto na Reserva Extrativista do Cazumbá-Iracema.
Antes, porém, um farto café-da-manhã no alojamento preparado por Noi com a ajuda da claridade que as janelas permitiam entrar. A energia elétrica havia saído ainda na noite anterior, logo depois que fomos nos deitar, e pela manhã ainda não havia voltado.
Preparados para conhecer a floresta, Nonato nos levou até onde estão localizadas as primeiras castanheiras mapeadas da Reserva. Pra chegar até elas, demos uma boa caminhada floresta a dentro. O caminho foi ficando cada vez mais estreito até a picada se acabar por completo.
Estávamos no meio da Floresta Amazônica, rodeados pela mais diversa fauna e flora do mundo. Para o Vinicius, biólogo de formação, não era exatamente uma novidade, mas para mim, a sensação de estar ali era mágica, surreal.
Tudo bem, não estávamos tão longe da civilização, nem passaríamos o dia inteiro ali, mas a experiência que dificilmente se repetirá (tão cedo) tinha pra mim um gosto bem especial, tão especial quanto o gosto de provar a castanha-da-Amazônia ali mesmo, aos pés daquela árvore majestosa.
Nonato nos contou sobre a colheita do ouriço e sobre os perigos de andar na mata quando é época da árvore lançá-lo ao chão a uma altura média de sessenta metros. Mostrou como eles fazem para quebrar a cabaça dura e resistente a queda. Nos falou que a floresta é a sua casa, que nada lhe falta, e que é ali que ele se sente bem e é feliz.
De bônus Nonato ainda mostrou como eles extraem o látex da seringueira e nos contou como essa atividade é importante na sua história de vida. Da borracha seu pai tirou o sustento para a casa e da mesma forma ele o fez para criar sua família. Hoje é o filho de Nonato que extrai o látex e cria seus netos com o artesanato feito com a borracha (que são lindos, por sinal!).
Voltamos ao alojamento antes do meio dia. À tarde teríamos mais diversão.
Indígenas, extrativistas, soldados e servidores permaneciam reunidos promovendo a integração e procurando, de forma conjunta, a solução para problemas que compartilham. Sem dúvida um dos momentos mais simbólicos de comunhão de esforços em prol do bem comum que já presenciamos. Um trabalho muito bonito tem sido feito no interior do país e nos orgulha muito saber que apesar de tudo, de toda tristeza e vergonha política que são noticiadas todos dias, aqui embaixo ainda encontramos muita força de vontade pra superar as dificuldades do povo brasileiro menos favorecido.
Bem, voltando ao nosso projeto, era hora de conhecermos o engenho de farinha que fica na comunidade. Jair e a esposa Gleiceane é quem produzem a farinha que leva castanha-da-amazônia na sua composição. Segundo eles, é a única no Brasil fabricada dessa forma. Pra chegar até o engenho foi preciso outra bela caminhada. Ele fica próximo ao roçado de mandioca, que tem uma área específica para o plantio. Estamos numa unidade de conservação lembram? Desmatar para plantar aqui (a menos que seja para um pequeno roçado de subsistência) é, pra dizer o mínimo, inaceitável.
Num depoimento muito bonito, Jair disse que encontrou muitas dificuldades quando começou a fazer a farinha, mas que recebeu o apoio de muita gente da comunidade que o incentivava a continuar no seu ofício. Hoje ele sobrevive da farinha que é uma das melhores – senão a melhor – que provamos no Brasil.
Acompanhamos o processo e aprendemos a fazer farinha de mandioca. Jamais esqueceremos do cheirinho dela tomando a consistência crocante na chapa quente. Tem vídeo no YouTube mostrando tudo! Clique aqui!
Aliás, quente também estava o dia. A chuva havia ficado pra trás e já não havia mais aquela sensação fresquinha de quando chegamos. A caminhada, o forno e a umidade da floresta nos fez suar muito!
Tudo o que queríamos (e precisávamos) ao voltar para o alojamento era tomar um banho. Sem energia elétrica ele seria frio, como na maioria dos lugares que passamos desde que entramos no Nordeste do Brasil. Mas o problema era maior. Sem energia a bomba que levava água para o reservatório não funcionava e, sem água, não há banho.
Perguntei a Noi como faria com o banho, se havia algum balde com água para ao menos jogar uma água no rosto. Prontamente ela respondeu: “banho só de cacimba”.
Sem saber exatamente do que se tratava, achei um alívio ter uma solução para o nosso problema. Descobri que cacimba é um buraco que se cava até atingir um lençol de água subterrâneo e que para nossa sorte havia uma perto do alojamento.
Lá fomos eu e Vinicius tomar banho de cacimba no meio da mata com a ajuda de uma caneca. Dadas as circunstâncias, entrar num ofurô num dia qualquer não seria tão prazeroso quanto foi aquele banho improvisado com água gelada.
Terminado o encontro do pessoal do alojamento, o pessoal voltou para suas casas e aldeias. Os que ficaram foram também tomar banho de cacimba. Nós ainda jantamos, conversamos e começamos a arrumar as coisas para partir no dia seguinte.
O dia foi cheio de experiências incríveis, de contato com a natureza e com pessoas simples e muito felizes que fazem o pouco se transformar em muito. Um riqueza que não se mede em cifras, mas em sorrisos e em liberdade que só o desprendimento proporciona. Sem dúvida, uma lição de vida que jamais esqueceremos!