A bebida alcoólica a base de café é apreciada em roda de amigos, como o nosso mate.
Calma! Você não irá ver nenhum italiano com a cuia na mão nos Alpes. A bebida que nos referimos no título é servida em um apetrecho de origem vegetal, como o porongo, mas é bem diferente do nosso chimarrão.
A analogia do título está na tradição, no ritual, na prosa solta e divertida que acontece seja quando os gaúchos sorvem a erva até fazer a cuia roncar, seja quando os italianos se juntam para beber o café alla valdostana.
Ambas são bebidas “conviviali”, como diriam os italianos. Elas até podem ser apreciadas num momento de solidão, mas na essência foram feitas para serem compartilhadas com os amigos.
Aqui do outro lado do oceano, a tradição de dividir uma bebida no mesmo copo tem igual significado cultural do nosso chimarrão, mas o seu conteúdo é completamente diverso.
O que é o Café Valdostano?
Bom, para início de conversa, “Valdostano” é o que é originário do Vale de Aosta, a menor província da Itália, que fica no extremo noroeste do país, fazendo divisa com a França e a Suíça.
Já o café alla valdostana, é a bebida alcoólica a base de café e grappa feita tradicionalmente para espantar o frio da região.
Essa é a minha versão pessoal sobre a origem da bebida que não creio estar dissociada da realidade. Por experiência própria, pude comprovar que o café valdostano ajuda muito a esquentar o corpo quando o termômetro marca zero grau!
A receita pode sofrer muitas variações, mas os ingredientes que não podem faltar são: café, grappa, açúcar e casca de frutas cítricas, como limão ou laranja. Cravo, canela ou zimbro também podem aparecer conforme o gosto da galera.
A bebida é bem gostosa e totalmente imprópria para menores. O café tá lá, mas é o sabor do álcool que se pronuncia.
É uma tradição de gente grande, cuja graça está justamente no modo de servir.
A bebida é usualmente preparada e servida em um copo diferente que de copo não lembra nada: é a Taça da Amizade.
Sobre a borda central do copo, é colocado açúcar umedecido com grappa, assim como se faz com sal e limão para tomarmos a tequila.
Antes de consumir, coloca-se fogo na bebida e se deixa queimar até que o açúcar da borda esteja caramelizado. Depois é colocada a tampa, o fogo se apaga e a taça começa a rodar pela mesa, no sentido anti-horário até que a bebida acabe.
A Taça da Amizade
Enquanto o chimarrão é preparado e servido no porongo, o café valdostano é servido na Coppa dell´Amicizia, um nome bonito que representa o caráter comunitário da bebida que é servida em seu interior.
Feita de madeira, especialmente de nogueira, a taça da amizade possui dois ou mais orifícios que é por onde a bebida é ingerida. Na teoria, a taça deverá ter tantos buracos quanto pessoas na roda. Cada um com seu buraco, para ser mais direta.
Na realidade, o número de bicos varia conforme o diâmetro do copo. O maior que vimos tinha 15. Nós ganhamos uma pequena Taça da Amizade com apenas dois bicos, o mínimo para a tradição fazer sentido.
A Coppa, que é sempre circular, é um produto totalmente artesanal, típico do Vale de Aosta. No topo do copo o artesão costuma entalhar a madeira com algum desenho representativo da região, como as videiras.
A tradição
Numa roda de chimarrão, as regra são claras: não mexa na bomba, não fique com a cuia na mão uma eternidade e sorva o líquido até o final antes de passar para o colega do lado.
Numa roda de “Café Valdostano” três são as regras do jogo:
1 – A taça deve girar em sentido anti-horário;
2- Todos devem beber em um bico diferente;
3- É estritamente proibido pousar a “Coppa dell’amicizia” na mesa antes de terminar o café!
Fazer a taça rodar a mesa até que o líquido termine é sinal de eterna amizade.
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Ingredientes (para 4 pessoas):
4 xícaras de café passado na hora
2 doses de grappa*
2 doses de licor genepy**
Açúcar a gosto (costuma-se colocar bastante, cerca de 5 colheres de sopa)
Casca de laranja e de limão
Modo de Preparo:
Polvilhe açúcar e aguardente na borda da taça da amizade***. Despeje a aguardente e o licor, adicione o açúcar, duas tiras finas de casca de limão ou laranja.
Prepare o café no modo tradicional brasileiro (longo e não expresso como fazem os italianos). Com um fósforo, acenda a mistura para caramelizar o açúcar polvilhado sobre a borda e, em seguida, apague-o fechando a taça com a tampa. Está pronto para girar na roda e fazer seus amigos felizes!
* Se quiser abrasileirar a receita é só substituir a grappa pela cachaça (peruanos podem substituir por pisco; panamenhos por seco; mexicanos por tequila; russos por vodka)
** Genepy é o licor típico do Vale de Aosta feito com um arbusto típico da região. Substitua o genepy pelo licor da sua preferência, como contreau ou amaretto
***Se você não tem a Coppa valdostana pode fazer a bebida numa caneca bem grande ou dividir em canecas pequenas.
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