Nixtamalização. O nome é comprido e complicado de falar. Mas isso foi no começo. Depois de cruzarmos toda a América Central, visto de perto dezenas de moinhos de milho trabalhando e ter provado centenas de tortilhas diferentes em diferentes países, a palavra agora já faz parte do nosso vocabulário cotidiano.
E precisamente nesse domingo, não só a palavra, como o processo de nixtamalização passou a fazer parte do nosso arquivo mental de técnicas culinárias.
Nixtamalizar é o que os mesoamericanos chamam de cozinhar o milho no cal. Isso mesmo, no cal usado na construção civil. O cal ajuda a abrandar o milho já seco e duro fazendo com que a casca solte do grão. A partir dai, o milho é lavado em água corrente abundante e depois já está pronto para ser moído e virar massa de tortilha. Quimicamente falando, ao ser dissolvido o cal ou o hidróxido de cálcio [Ca(OH)2] na água, separam-se as moléculas de Ca++ (cátion) e de OH- (íons). Com isso a película que reveste o milho é parcialmente destruída pelos íons, facilitando a entrada das moléculas de cálcio no grão*.
Ficou difícil? Acompanhe o passo-a-passo:
De fato é algo super simples e feito por gerações e gerações há centenas de anos. Faz tanto tempo que ninguém até agora soube nos dizer como surgiu a técnica. Em contrapartida todos sabem explicar porque ela está com os dias contados: industrialização.
Encontrar tortilhas feitas com milho nixtamalizado já não é tão fácil como antigamente, principalmente nos grandes centros. A tradição está cedendo espaço à farinha de milho industrializada que vem pronta só pra ser misturada à água. A farinha processada não leva o cal e via de regra é produzida com milho transgênico. Fora isso, a textura e o sabor das tortilhas feitas com farinha industrializada é bem menos interessante.
E o cal não faz mal à saúde? Bem, segundo estudos realizados para investigar essa questão, viu-se que não só não é prejudicial como é uma importante fonte de cálcio. Lembre-se que os mexicanos (e boa parte da população da América Central) comem tortilhas todos os dias, em todas as refeições.
E a gente teve o grande privilégio de ver o processo, aprender a fazer a massa e modelar a tortilha e, claro, prová-la quentinha logo depois de sair do comal. E detalhe: com milho cultivado ali no povoado, longe de mutações genéticas e agrotóxicos.
Quem nos propiciou essa experiência incrível foi o casal Ali e Andrés, os donos do rancho e tenda orgânica Ya´Axché que se dedica a produzir ovos e frangos orgânicos. Ali mesmo na granja, que fica no interior de Chiapas, pudemos acompanhar a nixtamalização feita por Cecília Guadalupe, um das senhoras que trabalham no rancho.
Enquanto o milho cozinhava no cal, fomos conhecer a criação das aves. O diferencial em uma granja de frangos orgânicos é que eles passam o dia soltos, ciscando os bichinhos pelo chão. Além disso, a alimentação dos animais é super importante: nada de preparados industrializados cheios de proteínas e outras coisitas. No Rancho Ya´Axché eles se alimentam de uma fórmula feita ali mesmo na granja, com milho e soja não transgênica produzida em Tapachula, que infelizmente já é coisa rara e que com o passar do tempo e com a mescla com sementes transgênicas a tendência é deixar de existir.
Andrés nos contou que ali no rancho um frango leva no mínimo 90 dias para o abate, enquanto que numa granja convencional esse prazo se reduz para 35 dias.
Com as tortilhas prontas, fomos almoçar e tivemos a oportunidade de provar um galo orgânico criado no rancho. A carne é menos gordurosa, mais sequinha e mais forte, mas nem por isso estava dura. Preparada em um marinado de pimentas, ela ficou macia e bem saborosa. Pra acompanhar tivemos tortilhas recém saídas do comal, feijão e berro (agrião) colhido na hora, na beira do riacho que corta o terreno onde está o rancho. Comida caseira deliciosa!
Ah, antes do almoço tivemos uma aperitivo: formigas chicatanas ou nucú catadas ali no rancho mesmo, um manjar exótico tipicamente chiapaneco. A nossa sorte é que a temporada de chuvas recém havia começado em Chiaplas. Essa é a época em que as formigas saem para um vôo nupcial e os mexicanos famintos pela iguaria a capturam.
E, já pra acompanhar o cafezinho depois da comida, tínhamos Pictes, pamonhas doces compradas no caminho para o rancho. Depois de cozidas, as pamonhas são assadas na lenha deixando o que já é bom, divino!
E assim passamos o domingo, dia 03 de junho de 2018, na companhia de Ali, Andrés e de seus filhos, aprendendo novos conceitos, novas técnicas, conhecendo novos sabores, trocando ideias sobre gastronomia, viagens e a vida. 🙂
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* Segundo informações extraídas do site: https://papeldeperiodico.com/2013/07/la-nixtamalizacion-del-maiz/
Qual a proporção de cal em relação ao milho?
[email protected]
1kg de milho / 2,5 L de agua / 15g de cal.
Onde encontro esse cal?
Eu comprei pelo mercado livre, cal virgem da marca Linhal
Na https://www.embaleme.com.br/ custa 1/4 do preço do mercado livre.
Bom dia
Vc diz :” O cal ajuda a abrandar o milho já seco e duro fazendo com que a casca solte do grão. ”.
Antigamente,
Talvez eles não conhecessem o processo de moagem !
Quando se mói o milho , isto já é feito naturalmente , não é?
Obrigado
A moagem não acrescenta Calcio em valor nutricional. E sem ele e sem o processo em si, partes do grão não são digeridas pelo estômago humano e seu conteúdo protéico não pode ser absorvido. Dessa forma, a metionina (um importante aminoácido essencial para humanos) é eliminada pelas vias naturais. Então, não basta moer …
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