Bugios e papagaios saudavam a chegada do sol nessa segunda-feira. Não tínhamos visto tamanha diversidade de fauna em nenhum outro lugar até agora. E olha que percorremos 16 mil quilômetros no Brasil, incluindo Pantanal e Amazônia. Além de macacos e inúmeros pássaros vimos bichos-preguiça, esquilos, iguanas gigantes, rãs multicoloridas, lagartos de todos os tamanhos…tudo isso sem procurar. Eles simplesmente apareciam…nas estradas, nas casas, na praia.
Mas a natureza exuberante presente na Costa Rica também representa uma ameaça. Estamos nos referindo precisamente ao peixe-leão, uma espécie que vem se alastrando por todo mar do Atlântico e devorando todas as demais espécies que vivem no mar.
Originariamente o peixe-leão só era encontrado nos mares do Pacífico. Por lá, o peixe-espada e outros predadores mantinham o controle populacional desse peixe tão bonito quanto devastador. Já no Atlântico, sem a presença de predadores naturais, ele acabou invadindo toda Costa do Caribe.
Como ele foi parar no Atlântico? Bem, há muitas teorias a respeito. Os pescadores de Limón acreditam que a espécie foi lançada ao mar por seu auto custo de mantimento. Um peixe-leão consome cerca de trinta peixinhos por hora. Assim como o ser humano negligente abandona cãezinhos nas ruas, teria soltado o peixe-leão nas águas do Atlântico. É o que chamam de “efeito Nemo”, em referência ao filme da Walt Disney que conta a história do peixinho perdido no oceano bem longe da sua casa.
Em 1992 teriam detectado as primeiras ovas na Florida e de lá pra cá começou uma explosão brutal e já em 2009 começa a se detectar sua presença na Costa Rica, na Venezuela, Colômbia, Cuba.
A questão é que agora a vida marinha está ameaçada e, por conseguinte, a atividade pesqueira, colocando em risco a subsistência dos pescadores artesanais de vários países da América. “Já não se encontram mais lagostas como antes”, nos conta José Ugalde, presidente da Associação dos Pescadores do Sul do Caribe.
“É que a lagosta tem seu curso viajeiro, ela sai da Flórida, cruza o México e baixa até a América do Sul. Elas tem um ciclo e depois dá a volta, subindo. Nesse trajeto colocam seus ovos e o peixe-leão os comem, não dando chance para a lagosta se reproduzir“, esclarece José.
É claro que os peixes não estão concentrados apenas no litoral da Costa Rica. Países das Antilhas tem reportando a presença maciça de peixes-leão e eles estão cada vez mais ao sul, se adaptando cada vez mais às correntes mais frias. Há inclusive relatos de que já teriam chegado à Porto Belo, em Santa Catarina, sul do Brasil. É uma ameaça mundial, portanto, e reverter esse quadro é essencial para a sobrevivência das demais espécies e também de quem vive da pesca.
Pensando nisso, alguns países como Cuba e Colômbia, já estão reintroduzindo espécies autóctones afetadas, como o peixe papagaio, o mariposa e os pargos.
Na Costa Rica, nos contou José, ainda não foi preciso reintroduzi-los, porque apesar de terem espécies bastante afetadas, consideram a situação controlada. De todo modo estão atentos e monitoram a presença do dito peixe na região. Todo peixe-leão pescado é levado à casa de Andrés Hernadez, um dos pescadores da Associação, que faz o trabalho voluntário de catalogar os dados sobre o peixe. Ele mede, pesa, verifica a presença de ovos e anota os dados que servem de base para os pesquisadores das Universidades da Costa Rica.
Pelas pesquisas o peixe-leão devasta tudo por onde passa. “Se tem 500 gramas, come aproximadamente 450 gramas”, conta o Presidente da Associação. E o pior, sem selecionar o que come, devora todas as espécies menores, acabando com o alimento das outras espécies, afetando toda a cadeia alimentar.
Ainda que aparentemente controlada a situação na Costa Rica, a Associação tem buscado alternativas para combater a praga. Para alertar a população e as autoridades acerca do problema, organizam anualmente um torneio que premia quem pesca a maior quantidade, quem pega o menor e o maior peixe-leão. O campeonato é realizado sempre no mês de setembro, quando é o pico de reprodução do peixe alvo. Segundo José, o evento atrai muita gente, inclusive estrangeiros, e agora a atividade já vem sendo realizada em outros países da América Central como forma de conscientização e tentativa de reduzir a espécie.
Além do campeonato, outras atividades são realizadas durante o torneio, como a degustação de pratos preparados com o pescado. Se no mar o peixe-leão não encontra predadores, o homem pode dar uma mãozinha nessa hora. Afinal, foi o homo sapiens que provocou esse desequilíbrio nos recifes do caribe.
Essa parte da solução do problema – tornar o peixe-leão alimento frequente dos humanos – aparentemente é simples já que a carne é branca, consistente e saborosa. Sim, nós provamos! Entretanto, segundo José, a espécie ainda é pouco procurada pelos consumidores porque muita gente crê que o peixe-leão é venenoso. É que seus espinhos dorsais protetores contêm veneno, porém a carne é perfeitamente segura para o consumo humano.
Sem procura, a pesca do dito peixe acaba sendo pouco rentável e desestimula a captura pelos pescadores agravando ainda mais a situação. Então, meus queridos, tratemos de consumir o peixe-leão! Aumentar seu consumo é imprescindível para fomentar a pesca. Além do mais, só temos a ganhar com isso: a ingestão de peixe-leão garante uma boa quantidade de nutrientes, já que é rico em ômega 3. Quer outra boa razão para consumi-lo? É delicioso!
Quem preparou um rico peixe-leão pra gente foi Blanca Espinoza, esposa de pescador e cozinheira de mão cheia. Com gosto do caribe, a carne branquinha do peixe-leão ganhou tons dourados ao ser frito em um pouco de óleo quente e ganhou ainda mais sabor só colocando sal e limão. Um farto acompanhamento a base de tomate, cebola e tomilho – a salsa caribenha, como é conhecida por aqui – deu o toque especial ao prato.
Pra seguir a risca o ditado dos pescadores de que “El mejor Pez León se sirve com patacón“, Blanca preparou o plátano amassado, verde e frito que não pode faltar no prato dos moradores do caribe costarriquenho.
Saímos de lá completamente convencidos a consumir peixe-leão e esperamos que você também possa ajudar nessa batalha.
A nossa conversa com os pescadores e a receita está no YouTube. Dê o play e assista!