Depois de uma noite fresca e bem dormida no posto Pemex, fizemos nosso café da manhã e, sem pressa, seguimos para o centrinho de Santiago Matlatán/ Oaxaca, a capital mundial do Mezcal.
A cidade é pequena e em poucos minutos se atravessa de uma divisa a outra. Isso, claro, é para quem não se aventura a entrar nas plantações de maguey nem fica batendo de porta em porta nas fábricas de mezcal como nós fizemos. Queríamos conhecer de perto e entender um pouco melhor a produção da bebida prima da Tequila.
O mezcal é feito a partir da mesma planta de que se extrai a tequila: o maguey. Existem mais de 200 tipos de maguey diferentes, a maioria selvagens. Enquanto a tequila só é feita com o agave azul, o mezcal pode ser feito com mais de um tipo, predominantemente com o tipo espadín. A planta demora cerca de 8 anos até esteja no ponto para fabricar a bebida. De cada espécie de planta se extrai notas aromáticas diferentes, igual ao que acontece com o vinho e as diferentes uvas.
O mezcal pode ser jovem ou de guarda, envelhecido em barris de carvalho assim como a nossa cachaça. Já pronta para consumo, o teor alcoólico da bebida pode chegar a 45°!
Todo processo começa com a colheita dos magueys e o corte de suas folhas. Depois a pinha – o coração do maguey – é levada a enormes rodas de fogo, onde ficam cozinhando por 3 ou 4 dias. Depois disso as pinhas são partidas em pedaços menores e levadas para serem prensadas por uma enorme roda de pedra movida por um cavalo. Depois de 3 horas nesse processo, todo bagaço é colocando em enormes barricas de pinus onde ficam por cerca de 5 dias em processo de fermentação. Em seguida tudo é levado a enormes panelas de cobre para finalizar a bebida com dupla destilação.
O sabor do mezcal é bem próximo ao da tequila, mas leva vantagem por ser produzido artesanalmente e, regra geral, por ser feito de puro açúcar de maguey. Já à tequila, com larga produção industrial, costuma ser adicionado outros açúcares, como o da cana.
Bem, depois de ver algumas plantações de maguey e aprender um pouquinho sobre o processo de fabricação do mezcal, fomos a um lugar muito especial: San Jerónimo Tlacochahuaya.
Sim, pronunciar o nome do lugar é difícil. Entender a língua falada no povoado, o Zapoteco, é quase impossível. Duas mil e trezentas pessoas vivem nesse povoado e quase todas se dedicam ao campo.
Entre essas pessoas estão Rogelio e Angelina. Com pouco mais de sessenta anos, ele se dedica a plantar milho e feijão; ela, de tomar conta da casa e da criação. No quintal da sua casa, que nem é tão grande, criam galinhas, porcos e perus. Dois touros e um burrico também vivem ali em harmonia com os demais.
Assim que chegamos, quase meio dia, perguntaram se já havíamos almoçado. Dissemos que não e Angelina se pôs a preparar algo para nós, já que eles costumam almoçar cedo, por volta das dez horas. E aí já identificamos a primeira cultura gastronômica distinta da nossa. O que chamamos de almoço, pra eles é uma refeição forte no meio da manhã.
Ou seja, pela manhã eles saem para trabalhar bem cedo sem comer nada. Sua primeira refeição é por volta das nove e meia, dez horas e se chama almoço e você já pode imaginar que é forte. Feijão, tortilhas, ovos mexidos e por aí a fora.Depois voltam a trabalhar e lá pelas três da tarde param para a Comida, outra refeição ainda mais pesada, como se fosse o nosso almoço.
Lá pelas oito da noite, jantam e se permanecem acordados ainda fazem um merenda lá pelas dez da noite. Sim, come-se muito no México! E no rancho come-se ainda mais!
Para a comida da tarde Angelina acrescentou massa de milho moído e herba de conejo ao feijão que sobrou do almoço. O gosto do feijão mudou por completo, era uma preparação totalmente diferente. O feijão renovado ganhou a companhia de ovos mexidos com chile de água. A pimenta era deixada na boca do fogão para tostar. Depois a pele queimada foi retirada em água corrente, assim como as sementes. Em seguida, a pimenta foi cortada grosseiramente e misturada aos ovos orgânicos mexidos. Tudo é comido com a mão, usando tortilhas com colheres. É um pouco difícil no começo, a comida cai por baixo e pelos lados, mas com tempo vamos pegando o jeito.
Depois de um leve descanso era hora de pensar na comida do dia seguinte, dia do 64º aniversário de Angelina. E pra comemorar ela resolveu fazer mole negro, um dos mais tradicionais de Oaxaca e o seu prato preferido. A principal etapa do preparo do mole foi feita ainda no final dessa quinta-feira: matar, limpar e colocar para cozinhar um galo e um peru.
O dia foi intenso e não poderíamos estar mais felizes. Nossa passagem por Oaxaca só estava começando e prometia! Depois de limpas as aves, tomamos banho gelado de caneca e ali, junto com os animais de Angelina e Rogélio, dormimos bem tranquilamente.