Nossa projeção de não passarmos por grandes cidades caiu por terra faz algum tempo. Ainda preferimos as cidades pequenas, com fácil acesso. Depois, porém, de termos encarado capitais como Campo Grande, Goiânia, Salvador, Fortaleza, Manaus, Arequipa e Lima, passar por Guayaquil, no Equador, não foi nada complicado. Com cerca de 3 milhões de habitantes, a maior e mais povoada cidade do Equador não assusta, pelo contrário.
O trânsito flui sem congestionamento. A exemplo de Cuenca, as ruas são limpas e arborizadas. As praças possuem jardins floridos e bem cuidados. Nem parece uma metrópole.
Foi com essa impressão que chegamos à Guayaquil por volta das onze da manhã.
Um pouco antes disso, ainda na rodovia, fomos parados por duas viaturas da polícia sob a alegação de que estávamos em velocidade acima da permitida. Com certeza absoluta não estávamos. Entregamos nossos documentos ao policial, afirmamos que estávamos trafegando na velocidade adequada e que tínhamos compromisso dentro de minutos em um restaurante da cidade. Ao falarmos isso a abordagem mudou completamente e nos mandaram seguir.
Depois desse episódio lamentável, só tivemos bons momentos na costa equatoriana.
Deliciosos momentos!
A comida típica do litoral, como não poderia ser diferente, é muito rica em frutos do mar. O Equador é um grande produtor e exportador de caranguejos, peixes, camarões, ostras e mariscos.Tudo isso e mais tivemos o privilégio de saborear na Marisqueria Marrecife, no centro de Guayaquil.
O chef Ivan Grain é também o proprietário do restaurante que tem 12 anos de história e vive lotado, de segunda a segunda, como pudemos presenciar naquela sexta-feira no horário do almoço.
A quantidade de pratos no cardápio é estonteante, assim com o tamanho da cozinha e quantidade de pessoas trabalhando para deixar tudo pronto para a hora do show. Como nos contou Denise, esposa do Chefe, para que tudo saia perfeito e sem demora é essencial que o pré-preparo esteja ok quando as pessoas começam a chegar para almoçar.
Detalhe, o restaurante abre às portas às 9:00 da manhã, horário em que alguns clientes chegam para tomar o café da manhã saboreando um prato de ceviche.
Foi por ele que começamos nossa investida gastronômica no Restaurante Marrecife. O Chef Gabriel, braço direito de Ivan, foi quem nos preparou a versão equatoriana do ceviche misto, que leva camarões, pescado, caranguejo e ostra. Diferente do que acontece no Peru, o peixe aqui fica marinando por cerca de uma hora no limão, para que fique completamente “cozido” no suco ácido da fruta. Os demais frutos do mar já vão cozidos para a montagem. A pimenta praticamente desaparece e deixa o sabor dos ingredientes sobressair. Um pouco de guacamole finaliza o prato, deixando tudo mais gostoso. Uma ótima aposta para que não curte o peixe cru, nem a picância característica do ceviche peruano.
Em seguida provamos um robalo com molho de camarões que poderia ser só mais corte de pescado sem grandes novidades não fosse o cozimento à vácuo a que a posta é submetida na fase de pré-preparo. A carne branquinha do peixe permanecia tenra por fora, macia por dentro.
A mesma técnica de cozimento no vácuo foi aplicada ao polvo que foi parar na frigideira só pra dar uma camada extra e crocante de sabor por fora. Batatinhas assadas também foram levadas para a panela só pra ganhar um toque de manteiga.
Pra finalizar, Gabriel preparou em instantes um arroz com frutos do mar de dar água na boca. O detalhe aqui ficou por conta da gordura do caranguejo, um pasta escura que ao aquecer deu gosto e ligou os ingredientes incorporados ao arroz branco já cozido.
Já sentados a mesa e na saga pela busca dos sabores do Equador, veio a mesa mais um prato típico: Sango de choclo com camarões. E que delícia estava. O sango é feito com milho cozido, liquidificado, peneirado e reduzido depois de incorporar um pouco de leite, sal e achote (urucum). Fica com a consistência de uma polenta mole, mas com sabor bem melhor!
Se tudo isso não bastasse, Denise e Gabriel já haviam nos oferecido uma entradinha pra colocar entre as melhores e mais fáceis do planeta. Banana verde assada acompanha de dois molhos (de abacate e de queijo) e sal pietra.
O que é sal pietra? Um tempero tipo uma farofinha feita com amendoim. Bom pra caramba!
Assista com foi nossa comilança no Marrecife!
Já deu pra sentir que a gente gostou muito da culinária do Equador, não é?
Com a sensação de termos provado alguns dos melhores pratos da cozinha crioula equatoriana, saímos da marisqueria e fomos a um supermercado próximo que fica dentro de um grande shopping no centro da cidade.
Os preços em dólar nos assusta um pouco. Se as frutas nos mercado público e nas feirinhas são baratas, os produtos industrializados são caros. Compramos o que era essencial e o que estava na margem de preço normal para os padrões brasileiros. Um único deslize totalmente justificável: uma caixa com quatro barras de chocolate Pacari, considerado por várias vezes o melhor chocolate do mundo.
Ah, uma curiosidade sobre os produtos industrializados comercializados no Equador. Eles tem obrigação legal de indicar de forma bem visível e em fonte colorida (verde, amarelo e vermelho conforme a prejudicialidade à saúde) os níveis de açúcar, gordura e sal presentes na composição. Muito interessante, não?
Depois do passeio no mercado pensamos em visitar o mercado de verdade, um dos mercados públicos da cidade. Sem sabermos se ainda estaria aberto, demos ao destino o benefício da dúvida e nos dirigimos para o bairro indicado no GPS.
Chegando perto do local, o calor que chegava perto dos 40ºC fez desabar uma chuva capaz de inundar completamente a estrada. O que pra gente era um pouco assustador para os locais era festa, afinal a chuva vinha refrescar a tarde quente de verão. As crianças, que por certo estavam de férias escolares, brincavam eufóricas embaixo da chuva. Vimos também alguns adultos se banhando nas cascatas que se formavam nas calhas dos prédios.
O mercado? Estava fechado. Nessa altura já estávamos cansados de tanto bater perna e entramos em contato com Simón, o guia da Reserva que conhecemos no dia anterior. Ele que já morou no Canadá por vinte anos e na Costa Rica por três, hoje mora sozinho e gentilmente nos ofereceu hospedagem em sua casa na grande Guayaquil.
Até cruzarmos a cidade para chegarmos até o condomínio em que ele vive a noite já havia dado as caras. Um banho, uma cama e um quarto com ar condicionado parecia uma ótima pedida naquela noite abafada da cidade de Guayaquil.