Aprendendo como se tosta os grãos de café [e outras dezenas de coisas]
Levantamos cedinho, antes das sete, pra tomar café. Mas não era qualquer café. Ele estava a 20 km de Xalapa, na colônia de Úrsulo Galván, entre as cidades de Xico e Coatepec.
Foi Nicolas Martinez que o preparou em método chemex, logo depois de ter tostado e moído os grãos cultivados na região. Nico, como é conhecido, é catador profissional, mas também se dedica a tostar café e foi para conhecermos mais desse processo que fomos até a sua casa.
Aparentemente não há grande segredo: o grão verde é inserido na máquina que é aquecido e movido constantemente. Alguns minutos depois, que pode variar entre 8 e 12, o grão sai torrado e quente. Daí é só passar por resfriamento e está pronto para ser moído e parar na xícara.
Por mais simples que seja, a tosta tem seus truques e se mal feita pode levar todo esforço empregado nas etapas de cultivo colheita, fermentação, secagem e seleção irem por água abaixo.
Um café especial ganha tosta média ou leve. Já os grãos de baixa qualidade são muitos tostados, justamente para esconder os defeitos. As notas gustativas mudam por completo a depender do ponto de tosta e por isso faz toda diferença na hora de degustarmos essa bebida apreciada em todo mundo, 99% das vezes de forma errada.
Mas o cenário vem mudando pouco a pouco e quanto mais houver demanda por cafés de qualidade a tendência é que o mercado se adapte a essa realidade. Ainda leva tempo, mas quem sabe um dia? Nico vem fazendo a sua parte, não só para difundir a cultura cafeteira, como também para garantir um preço justo para os seus fornecedores de grãos formados por pequenos cafeicultores que estão na base dessa cadeia.
Depois do café, foi a vez de provar o pão.
Em Coatepec, um dos 111 “pueblos mágicos” do México, visitamos uma padaria impossível de ser comparada com qualquer outra que já havíamos conhecido. São 130 anos fazendo pães 24 horas por dia em dois grandes fornos que nunca param de queimar lenha. Para poder escolher os pães que você quer levar para casa você passa obrigatoriamente pela produção e é difícil não se impressionar com o que acontece naquele local escuro, cheio de prateleiras e com paredes marcadas pela ação do tempo. Ali, dezenas de homens (não vi nenhuma mulher) amassam quilos e quilos de pães com uma agilidade incrível. As formas vão sendo preenchidas e aguardam sua vez de assar. Os pães são, em sua maioria, feitos com muita banha de porco e açúcar, é claro. Quando ali estivemos, por volta das dez da manhã, não havia nenhum pão salgado para comprar! O brilho da gordura grudada nas bocas dos fornos davam ideia da quantidade de gordura animal usada naquela centenária fábrica de pães.
Depois de provarmos seis variedades de pães doces diferente, ali mesmo dentro do carro, passamos em Xalapa só para nos despedirmos de Nelly, que nos presenteou com um kit emergência: um saquinho contendo chás para ajudar à digestão de todos os chiles, pães e tortilhas mexicanas.
Nosso próximo destino era Puebla, cidade com cerca de 3 milhões de habitantes. O número assusta um pouco e com certeza não iríamos parar ali se não fosse um ótimo motivo. Não há quem não mencione Puebla quando assunto é cozinha mexicana!
Já era quatro da tarde quando chegamos na cidade e não havíamos almoçado. Ficamos de olho na estrada se encontrávamos algum lugarzinho para matarmos a fome, mas vínhamos pela estrada pedagiada e não havia comércio local ao lado da rodovia. Quando nos demos conta já estávamos adentrando a cidade de Puebla. Fomos então direto ao La Parrilla del Patrón, a taqueria despojada do chef Alexandro Yeverino. E foi uma ótima decisão!
Alexandro nos preparou delícias na sua parrilha: burrito de picanha, tacos de flor de Jamaica e hambúrguer de grão de bico com pão de beterraba e milho azul. De sobremesa ainda teve sorvete, também feito de milho azul!
Aham, o México não vive sem milho e por isso, além da produção nacional, importar grandes quantidades dos Estados Unidos e também do Brasil. A diferença é que os milhos vindos de fora são amarelos e transgênicos. Aqui no México o milho amarelo é só um das mais de 50 variedades nativas, de diversas cores.
O principal subproduto do milho são as tortilhas, é claro, mas eles estão por tudo, nos pães, doces, bebidas e também nos sorvetes!
Gente, os últimos dias em Xalapa foram tão intensos, com tanta coisa para provar que confesso: não passei ilesa por toda essa comilança.
O dia que começou super bem terminou mal. Depois de quase dois meses no México senti os efeitos da comida apimentada e pesada. Uma cólica intestinal super forte me fez cair de cama às sete da noite. E isso responde uma das perguntas que mais nos fazem na viagem: “vocês já passaram mal alguma vez?” Eu, algumas. O Vinicius muito raramente.
Mas talvez não estou sendo justa com os chiles mexicanos. Talvez a indigestão tenha sido pela quantidade de comida ingerida nos últimos dias. Talvez tenham sido os pães da padaria centenária, um local lá não muito asseado. O tempo me dirá, afinal, nossa passagem pelo México ainda está longe de acabar e não será a última vez que comerei molhos picantes mexicanos. Sem chance!!