A manhã se passou pelas estradas colombianas cheias de árvores, sombra, caminhões e vários controles policiais. Depois de termos cruzado por vários, nesse dia fomos parados duas vezes e os documentos do carro foram o que menos chamaram atenção dos agentes. Recebemos várias dicas de onde e o que comer, do que fazer, o que visitar… os policiais colombianos são muito simpáticos e verdadeiros promotores do turismo de seu país!
Apesar de todo entusiasmo dos policiais, honestamente não foi seguindo dicas dos agentes que seguimos até Barrancabermeja, uma pequena cidade banhada por lagos e rios. O que nos levou até lá foi Zoraida, uma cozinheira de mão cheia, conhecida por manter as tradições culinárias do seu povo.
O calor de quarenta graus embaixo dos calhetões da casinha simples da cozinheira escondia vários tesouros. Farinha de plátano verde, farinha de mandioca, farinha de milho. Tudo isso ela mesma faz antes de preparar as receitas que a filha Heidy publica no facebook.
El Toque Colombiano é o nome da página em que compartilha as preparações que aprendeu no campo, que levou para a cidade e que agora ensina nos cursos de culinária que vem ministrando por todas as partes do país, a convite, inclusive, do Ministério da Cultura do governo federal.
Numa época em que tudo está pronto no supermercado, encontrar alguém que ainda prepara a própria farinha para fazer bolo é coisa rara. E por que isso importa?
Se você é como eu, de uma geração em que foi criada para trabalhar fora, para seguir uma carreira promissora, pra ter filhos só depois de ter conseguido um trabalho estável, pouco provável que lhe pareça importante fazer farinha em casa.
Não se trata especificamente de saber fazer, mas de tomar consciência do valor de cada coisa e de entregar seu tempo a coisas que não te dão retorno financeiro, mas mais qualidade de vida, mais saúde e bem estar.
Zoraida foi criada para saber costurar, cozinhar e ser boa esposa. Saiu do campo para que os filhos tivessem uma vida diferente, para estudarem e ter uma vida mais promissora.
Na cidade, entretanto, a história foi outra. Tinha que pagar aluguel, água e luz, coisa que não precisava no campo. Passou por momentos muito difíceis e foi resgatando o que tinha aprendido na roça – vendendo tamales, empanadas e sancochos – que conseguiu sobreviver.
Olhando de fora, a situação de Zoraida ainda não parece fácil. A casa não tem reboco, as janelas não tem cortinas, o teto não tem forro. Por outro lado ela passa os dias cozinhando, dando aula aos que querem aprender a cozinhar a comida crioula colombiana, viaja a convite dos que promovem os cursos e o melhor, compartilha isso com quem estiver interessado no mundo virtual e vive na companhia da filha e da neta no mundo real. Será mesmo que ela precisa de mais alguma coisa?
Foi depois de provarmos um doce combinado de várias frutas feitos por Zoraida e servidos educadamente por sua netinha que partimos com o a sensação de que precisamos mesmo rever nossos valores, sobre o que importa e sobre quem mais importa.
Sem destino certo, partimos em sentido à rodovia que liga a cidade ao norte do país. No meio do caminho, Vinicius viu a placa de um parque aquático em meio a umas árvores, brecou o carro e entrou.
Havia uma estrutura com piscinas e também para fazer trilhas com quadriciclos. O parque estava fechando, mas fomos super bem recebidos por dois cidadãos que trabalham por lá e que gentilmente nos permitiram passar a noite ali no parque, de graça.
Até banho de piscina rolou depois de termos passado tanto calor naquele dia! E com um por do sol no horizonte agradecemos por mais um dia cheio de bons motivos para continuarmos nossa aventura gastronômica pelo mundo.